Alvo de 1.567 processos na Justiça
desde 2009 - mais de seis ações por semana - o Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem) viveu boa parte de sua conturbada trajetória nos tribunais.
Somente contra a edição deste ano, que será aplicada aos candidatos no
fim de outubro, já se acumulam 12 queixas judiciais. Entre os motivos, a
consulta ao espelho de redação é um dos mais recorrentes. O acesso à
correção dos textos do exame foi reivindicado em 13 ações - originadas
na Defensoria Pública da União (DPU) e nas procuradorias do Ministério
Público Federal (MPF) em cinco Estados e no Distrito Federal. Até
agosto, a Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu derrubar os 13
pedidos, sob argumento de que exibir o espelho das redações era inviável
e representava prejuízo à administração pública e aos candidatos. Desde
2011 um Termo de Ajustamento de Conduta entre MPF e AGU garante aos
candidatos vistas da prova só para fins pedagógicos. Para os outros
casos, que vão desde problemas de edital até falhas de aplicação, a AGU
não sabe informar se há mais sentenças favoráveis ou contrárias ao
exame. Guerra fria. Veterano nas
batalhas contra concursos e vestibulares, o procurador Oscar Costa
Filho, do MPF cearense, é um dos principais responsáveis pela dor de
cabeça judicial do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão do Ministério da Educação
(MEC) que cuida do Enem. Para ele, que moveu ao menos 11 ações contra o
Inep, o volume de litígios é causado pela ineficiência do governo
federal. “Há falhas graves e o
exame é uma caixa-preta.” A pressão política sobre os juízes, segundo
Costa Filho, impede mais decisões contrárias ao exame. “O governo vai
diretamente aos presidentes dos tribunais para que eles suspendam
liminares”, reclama. Em fevereiro, a AGU pediu a saída do procurador ao
Conselho Nacional do Ministério Público, mas não houve afastamento. O
defensor público Ricardo Salviano acredita que a enxurrada de ações
ajudou nos aperfeiçoamentos pedagógicos e logísticos do exame. “Ao
fiscalizar, também discutimos soluções, como melhorias na acessibilidade
da prova a deficientes”, relata ele, que pediu a anulação das questões
do Enem 2011, que haviam vazado no Colégio Christus, da rede privada de
Fortaleza. Para Salviano, o Inep ainda deveria criar um canal mais
direto para queixas e dúvidas. A
preocupação de MPF e DPU com o exame não se traduz só nas ações civis
públicas. Entre 2009 e 2013, os dois órgãos também vasculharam
fragilidades do Enem em 733 procedimentos administrativos internos -
investigações e levantamento de dados pedidos por procuradores ou
defensores antes da abertura de processos. Vestibular jovem. Na
opinião do professor de Educação da PUC-Minas Carlos Jamil Cury, a
enorme escala do exame, que neste ano já tem 7,1 milhões de inscritos,
explica a quantidade de ações. A falta de tradição da prova em relação a
outros vestibulares é outro motivo. No Tribunal de Justiça de São
Paulo, constam pelo menos 11 ações nos últimos cinco anos contra a
Fuvest, responsável pelo vestibular da Universidade de São Paulo (USP),
que teve 172 mil inscritos em 2013.
Para
parte dos especialistas, as sentenças judiciais têm sido mais rigorosas
com o Enem do que com os outros vestibulares, que geralmente não exibem
espelhos das redações e resistem a revisões de nota. De
acordo com o diretor jurídico da Associação Nacional de Apoio e
Proteção aos Concursos, Leonardo de Carvalho, é natural haver mais
questionamentos depois que o Enem se transformou no vestibular de
algumas das melhores instituições do País. “A tendência é de mais ações,
pois as pessoas se veem motivadas a contestar no Judiciário”, diz. Em
nota, o Inep declarou que os advogados da União garantem segurança
jurídica ao exame e isonomia entre os candidatos. O Enem, segundo o
instituto, se firmou como “a régua republicana de acesso, de forma
inclusiva e qualificada”, às seleções do ensino superior público e
privado.
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