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quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Presas enfrentam o drama da separação dos filhos

27   Novembro   de  2014   Postado  por  jrnewsbahia: 


Três comprimidos tarja-preta não foram suficientes para ajudar Aline* a dormir. Depois de aguardar noves meses o nascimento de Gabriel*, ela se preparava para o revés do parto: a despedida. Na tarde seguinte, Ana Lúcia, sua cunhada, chegou à penitenciária para buscar o bebê. Antes de entregá-lo, Aline o pegou no colo e balançou o corpo para ninar o pequeno. Logo, ele dormiu. Ela acompanhou os dois até a porta da penitenciária. No caminho, uma detenta lamentou: “ô, dó”. Como Aline, cerca de 12 mulheres entram grávidas no Conjunto Penal Feminino de Salvador todo mês. Desse total, três completam a gestação enquanto estão no presídio, estima a assistente social da instituição, Simone Santana. Ana Lúcia pegou Gabriel em seus braços. Ele, ainda sonolento, agarrou a mãozinha na gola laranja da farda da mãe em vão. Mais tarde, já acordaria em outros braços e fora da prisão. Aline desabou no choro. Entrou em uma sala para ser revistada e, em seguida, encaminhou-se aos prantos para a carceragem. Enquanto responde por tráfico de drogas na Penitenciária Feminina de Salvador, ela deixará o pequeno aos os cuidados da irmã de seu marido, preso pelo mesmo crime que ela. As despedidas entre mães e filhos são consideradas um dos momentos mais tristes no presídio feminino. “Das agentes penitenciárias às outras presas, todos se apegam e se envolvem. O ambiente é de muita pressão e estresse, a presença deles tira o peso da cadeia”, diz a diretora da instituição, Luz Marina.Só no papel: A lei de execução penal estabelece que as penitenciárias femininas tenham berçário e creche para garantir a permanência das crianças na companhia das mães até os sete anos. Na prática, nem sempre acontece. Em Salvador, por exemplo, as detentas são obrigadas a se afastar dos filhos aos seis meses de idade. “O período do aleitamento é respeitado por ser um direito. O ambiente não tem aparato para o desenvolvimento da criança. O que está em jogo é o equilíbrio emocional e o aprisionamento dela. Estudos comprovam que elas passam a agir como se presas estivessem”, explica Andremara dos Santos, juíza da vara de Execuções Penais. A diretora da penitenciária cita o exemplo de uma interna que permanceu com a  filha até os seis anos. Ao ter contato com o mundo fora da carceragem, a menina entrou em choque.
Laço rompido: Assim como Aline, Ana*, Wanderléia* e Rosângela* também tiveram que interromper a rotina de mãe. Enquanto cumprem suas penas, os bebês ficam sob os cuidados da ONG Nova Semente, que é responsável por cuidar dos filhos de presidiários e ex-detentos. Dirigida pela freira italiana Adele Pezone, a organização fica a alguns metros do Complexo Penitenciário da Mata Escura. Às quintas-feiras, a religiosa leva os filhos para visitar as mães em um espaço fora da carceragem, chamado de “área polivalente”. É lá onde a pequena Camile* faz uma visita múltipla. A mãe, Ana, a avó e a tia da garota foram condenadas por assaltar apartamentos na Pituba. O ambiente carcerário é literalmente familiar à menina. O pai dela também está detido em uma das unidades do complexo. Diferentemente dos outros bebês, que saíram do presídio no máximo aos seis meses de idade, Camile permaneceu um ano e dois meses. “Como a mãe e a avó eram processadas e não sentenciadas, elas acreditavam que logo estariam em liberdade, porém foram condenadas a cumprir a sentença em regime fechado. Elas não queriam se separar da menina, mas um oficial de justiça teve de emitir um mandado para tirá-la daqui.”, comenta Geisa Copello, psicóloga da penitenciária.
Mulheres ficam presas às algemas até a hora do parto: Rosângela foi condenada a 12 anos por tráfico de drogas, crime de maior incidência entre as mulheres custodiadas na penitenciária. De um total de 166 internas, 90 estão encarceradas por envolvimento com entorpecentes. Ela chegou à prisão grávida de oito meses. Ela conta que, quando sentiu as dores do parto, falou para a agente e foi algemada até o hospital Roberto Santos, onde pariu. Quando por qualquer motivo a agente que a acompanhava precisava se ausentar, Rosângela voltava a ficar algemada. Érica Paranhos, 30 anos, que saiu da prisão em outubro, traz na memória as mesmas lembranças do momento do parto. Ela teve a filha Emily, hoje com três anos, quando estava presa. “Ter filho lá dentro é a pior coisa do mundo”, desabafa Érica. Segundo ela, as algemas só foram retiradas durante o parto. “O normal é parir algemada. Como o meu parto foi cesariana, o médico teve de pedir pra tirar, para que eu pudesse tomar a anestesia. Depois de parir fui algemada pelo pé e pela mão”, conta. As experiências relatadas por Rosângela e Érica desrespeitam as “Regras Mínimas para Mulheres presas”, documento divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2010 e que condena qualquer ato de coerção contra a mulher antes, durante e no período posterior ao parto. (Correio)

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